Bruno Liberal e a sedução do leitor

*Por Paulo Caldas

Sonhada por tantos escritores, a sedução do leitor acontece quando a habilidade do autor faz uso de recursos técnicos que a tornam possível. A narrativa na primeira pessoa, por exemplo, conforme Raimundo Carrero (um Pelé da técnica literária) é um recurso que traz o leitor para o ambiente onde se passa a cena, numa das formas de seduzi-lo.

Aliado deste artifício, Bruno Liberal pavimenta com habilidade outras veredas para o leitor caminhar ao seu lado. No conto Zunido Amargo provoca uma alegoria ao narrar com sutileza o instante em que a personagem enfermeira deixa por um instante de ser enfermeira, e ressalta em monólogo  interior (outro recurso técnico): “Notei sua boca carnuda, então fiz besteira e disse que ela era linda. Saiu batendo a porta, sempre digo isso às mulheres você é linda e a maioria aceita”. Entende-se que houve clara mudança de atitude da personagem apoiada na frase “deixando por um instante de ser enfermeira”.

No conto O instante da nuvem negra, nos leva à reflexão o diálogo do protagonista com o personagem definido como um homem velho, “Nada pode ser mais importante do que a ilusão de um sorriso”. Na sequência, evidencia o gestual do personagem: “Parou de batucar e olhou suas mãos distantes, antigas. A pele manchada pelas ranhuras da vida”.

Com singular destreza Liberal opta pela narrativa na terceira pessoa e com os olhos transformados em câmeras, no texto Sara e os Pôneis, define o cenário com a metáfora “O dia se enchendo de noite” e arremata com a símile “Como lama na piscina transparente”, do mesmo modo, mais adiante destaca: “Fez frio naquele instante. Era como o gelo dentro dela gritando o nome da filha”. Noutros momentos passeia pela alameda do bom humor em A espera, quando segue o atalho da ironia: “Desaprendi a beijar em oitenta e um. Nada de mais, só não sabia mais o que fazer com a língua”.

Em Olho Morto Amarelo, conto que dá título ao livro, o autor com absoluta seriedade, brinca com as suas possibilidades criativas e se aproxima do mágico,  talvez o melhor momento do conjunto de sua escrita. Contudo, na opinião deste comentarista, o clímax do livro reside no Gato de Fogo, quando numa provável reminiscência, remete os leitores às próprias saudades.

 

À primeira vista, o leitor pouco atento, por certo vai perceber que não está diante de um contista comum; mesmo considerando Bruno Liberal jovem escritor com pouco mais de 45 anos de idade e na bagagem um livro lançado. Ele encaixa palavras nas frases de tal modo que às vezes o emprego de ligações usuais, palavras afastadas do binômio função/efeito ou a marcação de vozes entre aspas, pecados veniais que não maculam a estética da narrativa.

*Paulo Caldas é escritor

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