Daniel Queiroz: “O celular pode perder seu protagonismo”

Daniel Queiroz tornou-se presidente do Sinapro-PE (Sindicato das Agências de Propaganda de Pernambuco) e, mais recentemente, da Fenapro (Federação Nacional das Agências de Propaganda) numa conjuntura desafiadora. Além de enfrentar uma das mais longevas crises econômicas do País, a publicidade, como todo setor, enfrenta o turbilhão de transformações provocadas pelas novas tecnologias. Aos 42 anos, formado em administração de empresas e descendente de uma família empresarial que construiu a bem-sucedida agência Ampla, Daniel garante que só o conhecimento e o profissionalismo publicitário podem garantir a comunicação das marcas nestes tempos de mudanças constantes. Nesta conversa com Cláudia Santos, ele falou sobre o comportamento do consumidor, o futuro das mídias e preveniu que novas mudanças estão por vir e podem tirar o protagonismo do hoje onipresente smartphone.

Como está sua gestão à frente do Sinapro?
É a gestão de um time. Temos um histórico de uma liderança associativa sozinha. Isso nem é culpa do líder associativo, mas do ambiente empresarial que não se mobiliza em torno do bem comum. Meu discurso desde o início foi: vamos assumir juntos uma gestão para que mais pessoas façam algo por todos. Formamos a chapa Time Sinapro com 20 integrantes, como exige o estatuto. Assumimos, em prol do mercado, ações com um plano estratégico para ser executado em três anos de mandato, a partir de julho de 2018. O primeiro passo foi entender como funcionava a entidade no papel de interlocução das demandas do mercado e do ponto de vista operacional. Também atuamos na oferta de serviços que levassem às agências um domínio maior sobre as transformações que o negócio está vivendo. Criamos uma plataforma chamada Chacoalha, com o objetivo de dar uma chacoalhada no conhecimento. Ela consiste em levar para os profissionais das agências informações sobre o que cada meio está vivendo de mudanças e o que há de tendência. Não há nada parecido com que aconteceu nesses últimos anos. Podemos até fazer referência da mudança tecnológica com a chegada dos computadores, que estava mais ligada a produtividade e agilidade. Agora, vivemos uma mudança de comportamento. Precisamos entender como a comunicação pode atingir de maneira mais eficaz as pessoas diante dessas mudanças. Também inovamos no Prêmio de Propaganda de Pernambuco (PPP), que historicamente era um momento de aplaudir a produção publicitária feita ao longo do ano. Nessa última edição, antes da premiação, apresentamos 10 palestras com conteúdos relevantes sobre toda essa transformação. Foi um movimento muito bem aceito, que também gerou debates, conversas, análises. Em paralelo, percebemos que o Sinapro não tem uma estrutura para manter esse modelo vivo, independentemente da liderança que for eleita. Estamos organizando essa governança, preparando profissionais para que eles sejam os tutores e os executores do projeto que a diretoria pensa e lidera.
Como as novas tecnologias impactaram o trabalho das agências?
Agência e anunciante ainda estão aprendendo a lidar com todas essas transformações. Com as facilidades das redes sociais, alguns empresários passaram a acreditar que eles próprios poderiam fazer a sua comunicação e, até certo nível, isso é possível. Mas as empresas de até um determinado nível para cima requerem estratégia, conhecimento do impacto da mensagem e da relação da marca com o consumidor. Nesse caso é preciso um trabalho mais especializado. Vi uma frase que diz: “ficou muito fácil você chegar no coração do seu consumidor”, porque o mundo mobile permitiu isso por meio das redes sociais. O mais importante, porém, não é só chegar, é o que fazer quando você chegar lá. Continuo acreditando que só por meio de profissionais especializados é que os anunciantes vão conseguir saber o que fazer quando chegam no coração dos seus consumidores. Até porque, no mundo em que a gente está vivendo, a quantidade de mensagens é enorme. Se facilitou para você como empresário chegar no coração do seu consumidor, facilitou também para todos os seus concorrentes.
Que mudanças a internet promoveu na publicidade?
Antes, a comunicação era um caminho de uma via. Como marca, você comunicava e conquistava ou não as pessoas, aquilo ali já era o seu resultado final. Com o mundo mobile, o caminho é de duas vias, o consumidor é conquistado ou não e ele fala bem ou mal de você. E é bom que fale mesmo porque é falando que a gente vai aprendendo onde a gente está acertando ou não como marca. Mas ao mesmo tempo isso se tornou muito mais difícil porque o consumidor também fala sobre sua marca e não só você. E aí é onde está o segredo do que fazer quando chegar no coração do consumidor. A história do boca a boca nunca foi tão forte como agora em que a partir de uma simples pesquisa na internet sabe-se o que outras pessoas acham daquele produto que você está pensando em comprar. A tecnologia é um meio que veio transformar o comportamento e quem não souber lidar com esse comportamento não adianta ter o meio disponível porque não vai saber usá-lo.

Como ficam as mídias tradicionais em meio a essas transformações?
Elas continuam tendo relevância. São elas que trazem para a gente o ambiente confiável da informação. No mundo fácil da internet, a informação vem de todos os lados e de todas as formas, mas quando queremos checar alguma coisa, recorremos aos veículos tradicionais independentemente do tipo de plataforma em que estejam. Hoje, assisto a Globo no celular e no computador. Antes via só no canal 13 da TV. Eu só lia a Algomais, se eu recebesse a revista na minha casa, hoje sou impactado pela Algomais numa rede social, quando faço a assinatura no digital, quando ela cria um conteúdo no Youtube e ele for compartilhado chegando até a mim. As pessoas estão muito no embalo de uma visão no que veem aqui (aponta para o smartphone), mas o rádio continua existindo, o conteúdo impresso, se perdeu força no papel, está com força enorme em suas plataformas digitais principalmente por levar informação checada e consistente. Muita gente diz que não vê mais TV, mas esse meio recebe 60% do bolo publicitário. A TV chega em todo mundo. Pode-se até dizer que a internet também chega, o post que chega pelo WhatsApp também. Beleza, mas qual é a certeza disso? Ele vai chegar se aquele grupo for engajado com aquela mensagem. Mas para uma marca chegar em todo mundo precisa ter um composto de comunicação que não é só a TV, por mais forte que ela seja, mas todos os outros meios, dentro de uma estratégia que faça com que a comunicação chegue aonde tem que chegar.

É verdade que os jovens não estão dispostos a pagar pela informação?
Os veículos estão vivendo essa transformação de maneira intensa também. Continuo achando que a alternativa pra tudo isso continua sendo a publicidade, porque ela vai viabilizar que o conteúdo chegue às pessoas. Estamos num momento em que ainda não temos condições de saber se o que a gente está vivendo agora é o que vai permanecer. Ainda viveremos muitas mudanças. Temos os cases de jornais, como Washington Post e The New York Times que vendem seus conteúdos. O consumidor vai entender que para ter determinadas informações terá que pagar. Ou o investimento publicitário vai viabilizar a geração desse conteúdo sem que o consumidor final pague por ele. Mas, tudo é uma incógnita. Há estudos que dizem que o aparelho celular não terá mais esse protagonismo. Outros devices (dispositivos) vão assumir esse lugar. A experiência de voz está começando a chegar por meio do Google Home, do Siri da Apple, e da Alexa da Amazon e está começando a deixar o celular de lado. Antes, para saber a hora, se não tenho relógio, tirava o celular do bolso. Agora, basta perguntar a algum desses devices. Muitas marcas já se preparam e estão criando seu ambiente de relacionamento por voz. Mas, como a publicidade se encaixa neste caso? Vem um novo desafio pela frente. Isso cada vez mais exige profissionalismo, conhecimento, domínio. Quanto mais acessíveis são as coisas, mais especialidade elas vão exigir, e é nesse ambiente que as agências se enquadram.
A polarização e os ânimos exaltados que se vê nas redes sociais também impactam a publicidade?
Nem todo mundo tem a mesma visão sobre as coisas. Antes a mensagem chegava e parava no público que a aceitasse ou não. Agora a mensagem quando chega no público que não a aceita, ele vai responder pelo mesmo canal que a marca usou, ou então com comportamento, com boicote, com diversas formas. Um exemplo disso está nas manifestações que países mundo afora passaram a ter de 2013 para cá, porque essas pessoas passaram a se organizar melhor por meio da internet. É mais fácil. Isso tem levado a um aprendizado maior para as marcas de como se posicionar e de como conversar com esses públicos. Mas não vai dar para agradar a todos. Por algum encaminhamento estratégico, algumas marcas estão definindo o público que querem atingir e terão que abrir mão de um outro público que não vai se agradar da sua mensagem.

Como você analisa o impacto da publicidade no consumismo de crianças, em especial dos influenciadores digitais?
Além de profissional da área, sou pai de três filhos, vivo isso em casa. Existem mecanismos de bloqueio para impedir que crianças vejam coisas que não deveriam ver, mas eles não são eficazes e elas acabam sendo impactadas por mensagens inadequadas. O consumismo nas plataformas digitais está muito forte e educar uma criança hoje nesse ambiente aberto é muito difícil. Não tenho visto uma força legislativa para impedir ou adequar melhor essa situação. Acho que os pais e as crianças ainda estão muito à mercê do que essa liberdade da comunicação na internet tem provocado. A gente sabe que de um tempo pra cá, muitas leis foram criadas para proteger o público infantil nesse ambiente da comunicação, mas não vejo isso ser eficiente na plataforma digital.

Você foi eleito presidente da Fenapro. Quais são seus planos?
Estou entrando num momento crítico, o desafio é muito grande. Tenho esse olhar apurado para a força associativa porque acho que ela melhora o nosso desempenho individual como empresa. Já faço isso no Sinapro e vou levar essa leitura em âmbito nacional. Tenho também um viés muito forte para a gestão, e quero levar para o ambiente federativo mais conhecimento e domínio empresarial para que as agências, enquanto empresas, consigam viver essa transformação que vai bater no desenvolvimento profissional em cada integrante das suas equipes. O ano de 2014 foi uma espécie de auge no aspecto financeiro e de geração de negócio do setor, mas de 2015 para cá foi só “sofrência”. Nosso setor é muito pautado pela confiança dos empresários no cenário econômico e político. Se ele não tem confiança, não investe. Estamos há cinco anos com o mercado de comunicação muito retraído. Essa pequena retomada em 2019 mostra que as pessoas não estão mais dispostas a ficar retraídas por mais tempo. Mas esses cinco anos de crise levaram as agências a se verem melhor como empresas.

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