Edgard Leonardo: “O Brasil pode ter vantagens ao enfatizar a sustentabilidade”

Os próximos meses não serão fáceis para a economia brasileira e pernambucana. A possibilidade de uma segunda onda da pandemia, a dificuldade de a população adotar as medidas de prevenção ao coronavírus e a perspectiva de que ainda vai levar um tempo para os brasileiros se vacinarem contra a Covid-19 são alguns indicativos das dificuldades que estão por vir. Um cenário que impacta no crescimento econômico e no nível de emprego. Mas, segundo o professor Edgard Leonardo, da Unit (Universidade Tiradentes), existem algumas boas perspectivas também. Nesta conversa com Cláudia Santos, ele analisa as vantagens que podem surgir caso o País adote a economia verde, salienta o espaço que se abre com a desconcentração da produção industrial na China e com a liquidez internacional, e traça um panorama positivo para Suape.

O que muda na economia do Brasil e de Pernambuco com a vitória de Joe Biden para a presidência dos EUA?
As relações diplomáticas entre o Brasil e os EUA existem e certamente permanecerão independentemente de quem esteja no papel de presidente. Com Joe Biden, a pauta da ecologia e dos direitos humanos seguramente ganha relevância e perde o alinhamento que havia entre o perfil pessoal de Trump e Bolsonaro, o que deve resultar em uma mudança na política externa brasileira que será menos personalista.

A pauta da ecologia certamente resultará em maior pressão sobre o Brasil, porém vale salientar que nosso País é um grande player no cenário do agronegócio e os EUA historicamente têm-se utilizado de todos os meios para obter vantagens nos mercados onde concorremos. Os EUA protegem (embora não pareça ser o discurso) produtos de grande interesse dos exportadores brasileiros, subsidiando a produção local de açúcar, milho, soja, algodão; e tarifando o açúcar, o fumo, os derivados lácteos e a carne bovina brasileira.

O Auxílio Emergencial será distribuído até dezembro. Como fica a economia e a situação das pessoas economicamente mais vulneráveis?
O melhor auxílio sempre será o emprego. Uma economia forte, com crescimento estável e duradouro, que permita a criação de emprego e renda para sua população. Todavia, estamos longe disso e um dos grandes riscos que corremos, que impactaria inclusive nossa produtividade, comprometendo nossa retomada e nossos sonhos a médio e longo prazo, é que o desemprego e o subemprego elevados e prolongados podem gerar a chamada histerese no mercado de trabalho. O termo se refere à dificuldade da taxa de desemprego voltar ao seu estado original após sofrer um choque ou, em outras palavras, a dificuldade do desemprego ceder após uma alta pronunciada e duradoura.
A histerese poderia deteriorar o capital humano quando ainda temos uma parcela grande de jovens no mercado, comprometendo nossa produtividade. E vale ainda salientar que para os próximos anos não teremos mais o chamado bônus demográfico. O fato é que, mesmo com a retomada do crescimento e com o aumento esperado de 3,6% do Produto Interno Bruto em 2021, o nível do PIB ainda estará significativamente abaixo do que estaria, caso o País tivesse seguido a tendência anterior, pré-crise. O que infelizmente ainda resultará em níveis de emprego muito baixos.
Por isso, além de necessárias às camadas mais desassistidas da população brasileira (que já são muitas e tendem a aumentar), essas medidas são imprescindíveis e já se mostraram importantes para segurança alimentar dessas populações e para manutenção dos níveis mínimos de atividade econômica.

É preciso manter a sinalização clara do compromisso com o equilíbrio fiscal e continuar com as reformas. O Brasil oferece boas oportunidades de investimento em um momento de alta liquidez internacional. Os gargalos de infraestrutura, evidenciam que há oportunidades de investimentos que podem atrair investidores nacionais e estrangeiros.
Um grande mercado potencial é um de nossos atrativos; além de vantagens comparativas ainda não totalmente exploradas, principalmente na cadeia do agronegócio, onde é possível aproveitar ainda mais nossas vantagens, aumentando a nossa competitividade na indústria de alimentos. Não podemos esquecer das micro e pequenas empresas que representam cerca de 95% das empresas do País e respondem por quase 60% dos postos de trabalho formais, que carecem de medidas acessíveis e o caminho precisa ser direto via BNDES e bancos estatais.

O Senado aprovou recentemente o projeto de autonomia do Banco Central. Caso ele seja aprovado na Câmara, quais serão as consequências para a economia brasileira?
O debate de um Banco Central com maior autonomia, embora seja uma posição defendida pelo Governo Bolsonaro, não é um debate recente e vem sendo discutido há um bom tempo pelo Legislativo brasileiro. Hoje, os membros do BC podem ser livremente nomeados e demitidos pelo presidente. No projeto aprovado, o presidente e os oito diretores terão mandatos fixos de quatro anos e o mais interessante é que os períodos não serão coincidentes com o mandato da Presidência da República, o que certamente permite maior liberdade de atuação.

Todavia o papel da entidade permanece: atuar pela estabilidade e pela eficiência do sistema financeiro, zelar pela estabilidade de preços sendo o executor da política monetária; além de fomentar o pleno emprego. Uma autoridade monetária independente é importante para proteger a instituição e, com isso, todo o sistema financeiro de interferências político-ideológicas, mantendo uma maior confiança em todo sistema.

Pesquisas apontam que países com independência da autoridade monetária apresentam inflação mais baixa, dada à redução no risco de que em períodos eleitorais medidas pouco saudáveis do ponto de vista econômico sejam tomadas para viabilizar candidatos apoiados pelo atual mandatário. Outro ponto a salientar é que temos no mundo exemplos de bancos centrais independentes: EUA, Zona do Euro, Canadá, Reino Unido.

O senhor acha que a chamada economia de baixo carbono tende a ser adotada por muitos países, como tem sido orientado por especialistas em todo o mundo?
Ficou claro em momentos recentes que existe uma grande concentração de atividade industrial na Ásia (na China em particular), o que exporia os países a riscos de abastecimento. Tal percepção aponta uma tendência de desconcentração da atividade industrial gerando vantagens para o Brasil nesse cenário. A questão da mudança climática é uma das grandes preocupações atuais e, certamente, o Brasil poderia apropriar-se de uma série de vantagens, atraindo negócios para esse tipo de indústria. Um dos grandes problemas nessa questão diz respeito à produção de proteína, importante para economia nacional e criticada por alguns. Porém, precisamos lembrar que somos pioneiros na produção de biocombustíveis, utilizamos uma matriz energética baseada em fontes renováveis e nosso agronegócio tem apresentado uma grande evolução quanto às questões ambientais, com a criação de protocolos apropriados à mitigação dos impactos (inclusive o setor de proteína animal).

O Brasil pode, sim, obter vantagens competitivas nesse mercado, enfatizando a bandeira da sustentabilidade e compreendendo que a melhor maneira de garantir melhores condições ambientais passa por condições de saneamento básico, educação e ganhos de renda para população. Neste sentido é importante que tenhamos políticas que aproximem e criem pontes e, não, barreiras ao desenvolvimento econômico sustentável.

LEIA A ENTREVISTA COMPLETA NA EDIÇÃO 176.2 DA REVISTA ALGOMAIS

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