Por que os médicos escrevem? Parte II (Por Paulo Caldas)

Dentre os renomados vultos da Literatura, são incontáveis os de formação nas áreas do Direito, da Filosofia, da Política e outras profissões cujo cotidiano os motiva ao hábito da escrita.

Mas e os médicos? Por ter uma vida a lidar com as mazelas alheias, o que os estimula o apego às letras? Como definir o surgimento do genial Tchekhov, de um João Guimarães Rosa, Conan Doyle, Jorge de Lima e tantos mais que se tornaria cansativo citar?

Qual então o motivo desse fascínio pelo ato de escrever? Será a chamada vocação ou o estímulo vem do contato com o humano? E a especialidade médica, contribui para essa tendência? Vejamos pois o que dizem:

Gentil Porto

“Sinto-me à vontade para falar sobre o meu outro lado ou então do outro lado do birô. De um lado estou como médico ouvindo as queixas do cliente e sem a preocupação açodada – quase onipresente nos dias de hoje – da requisição  da malfazeja ‘bateria’ de exames. À moda antiga, ainda acredito no velho axioma de ‘curar se possível, amenizar a dor frequentemente… Mas confortar sempre’. Do outro lado está o escritor-ouvindo, lendo e escrevendo. Diz Rostand Paraíso que a ‘Literatura sempre exerceu sobre os médicos uma inegável paixão’.

No meu caso, ainda menino, decidi ser médico embora o outro lado estivesse sempre presente. Talvez influência do meu avô paterno leitor impenitente, do meu avô materno tabelião e poeta da cidade de Pesqueira, sem esquecer o meu pai autodidata que costumava escrever para os jornais de Caruaru, cidade da minha infância e adolescência.

Como exercício de memória poderia citar grandes nomes da literatura que eram médicos, mas se tornaria repetitivo. Por aqui, a Academia Pernambucana de Letras tem vários médicos e a Sociedade Brasileira de Médicos Escritores – Regional PE, é uma das mais atuantes do país”. Gentil tem publicado, entre outros, os títulos: Diário de Bordo, Cartas, crônicas e outras coisas, Antônio Gasolina – Romance, Vento Norte– Romance, Porto Gentil – Crônicas, E o Tempo Passou– Crônicas.

Rostand Paraíso

“Não é de hoje a paixão dos médicos pela Literatura. Isso se explica pelo farto material que dispõe dada a convivência com o sofrimento e a morte. E sabemos que o sofrimento propicia à Literatura. Aliás, Orígenes Lessa dizia ‘Sem sofrimento não há Literatura’. O professor Rui João Marques afirmava ‘o médico conhece o homem, suas reações diante do cotidiano e do imprevisto, as singularidades e aberrações, temas para romancistas e poetas’.

No meu caso diria que o desejo de escrever me veio de repente, sem uma razão aparente. Desde a juventude, gostei de ler. Revistas, as poucas que tínhamos então (O Malho, Fon-Fon, o Tico-Tico, a Careta, o Eu-Sei- Tudo, a Scena Muda), os almanaques do Capivarol, do Biotônico Fontoura, o da Saúde da Mulher e livros, principalmente os policiais e os de aventuras (Júlio Verne, Dumas, Conan Doyle, Agatha Christie, Edgar Wallace), histórias que me deslumbravam pelos desenhos soberbos (Flash Gordon, Jim das Selvas, Príncipe Valente, Agente Secreto X-9) e textos inteligentes, elaborados por escritores já famosos.

Essa paixão pelos quadrinhos cresceria e me levaria, nas minhas viagens, a visitar editoras italianas (em Roma e em Gênova), especializadas em reedições de luxo das histórias clássicas, e, criei uma grande biblioteca sobre elas. Nos poucos momentos que a atividade médica me permitia, eu que só escrevia roteiros de aulas e artigos para congressos, comecei, sem maiores pretensões, a rabiscar sobre os meus heróis dos comics. Escritos mantidos inéditos com receio do que pensariam meus alunos e clientes.

Alguém, no entanto, me dedurou e, em 1989, o Jornal do Commercio publicou Quadrinhos, paixão de toda uma vida, com fotos minhas e da coleção de gibis. Foi surpresa para mim a boa repercussão e assim ousei publicar aqueles artigos engavetados. Aproveitando os momentos disponíveis comecei a escrever sobre outros temas, e lembrando Conan Doyle, criador das histórias de Sherlock Holmes e os contos de ringue, de piratas e de mistério, que o tornariam célebre.

Estimulado pelos amigos, comecei a pôr no papel lembranças dos tempos da faculdade, e, como se estivesse numa máquina do tempo, fui ter a um passado mais distante, às brincadeiras de infância, aos velhos carnavais e tanta coisa mais. Daí, como se tivesse engolido uma “pílula-escrevente”, no começo escrevi febrilmente depois, de uma maneira mais calma, mas sem parar. Foram, ao todo, 15 livros, quase todos sobre o Recife e apenas um – não podia faltar – sobre os quadrinhos (A magia dos quadrinhos)”, concluiu.

Dentre os títulos publicados por Rostand, estão: Livros, livreiros e livrarias, O Recife e a Segunda Guerra, A indefinível cor do tempo, Tantas estórias a contar…, e Esses ingleses…

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