Desafios ambientais de Goiana e as experiências da Stellantis na região

*Por Rafael Dantas

A chegada de um grande polo industrial em geral cria preocupações acerca do impacto ambiental da instalação e operação das fábricas. Após inúmeros casos ao longo das últimas décadas da formação de clusters, com passivos de poluição e destruição ambiental, muitos dos novos investimentos do século 21 já nascem com uma proposta ambiental mais responsável. Embora, isso não seja uma regra ainda. Na análise do pesquisador e professor do IFPE, Anselmo Bezerra, a chegada do polo automotivo de goiana não trouxe nenhuma mudança significativa na questão ambiental da região. “A fábrica da Jeep não trouxe um impacto ambiental significativo, como aumento de poluição e resíduos, até por ser uma multinacional que tem uma política muito rígida na área ambiental, com certificações que a impede de ser poluidora”.

Os desafios ambientais da cidade e da região onde se instalou o pólo, porém, não são pequenos. Anselmo destaca que há um cenário herdado de séculos, cuja origem dos principais problemas está na questão fundiária, especialmente pela produção de cana de açúcar, além do histórico processo de desmatamento e fragmentação da mata atlântica da região. “A partir dos anos 90 houve uma série de medidas para reduzir o impacto e controlar mais esse processo, além da maior visibilidade da questão ambiental pela população. Esse processo histórico de desmatamento vai sendo reduzido. Mas, mesmo com redução, não têm o fim desse processo. Tem pequenas áreas sendo desmatadas, por atividades extrativistas, como a coleta de lenha, caça e a agricultura não sustentável. Goiana tem pouco ainda do que restou da Mata Atlântica”.

Outra preocupação levantada pelo pesquisador é acerca dos recursos hídricos e dos manguezais. “Em sua maioria, eles sofrem com a poluição de dejetos, principalmente domésticos. A falta de saneamento faz com que esgotos se comuniquem com o manguezal, que é um berçário de várias espécies marinhas, com impacto na diminuição dos pescados. O uso de agrotóxicos na agricultura, que ainda abrange uma área extensa no município, acaba por prejudicar o solo e os cursos d’água da região”.

EXPERIÊNCIA AMBIENTAL DA STELLANTIS

Com o pólo automotivo tendo sido contruído sobre uma região de plantação de cana de açúcar, não houve na instalação das fábricas a redução dos resquícios de mata atlântica da região. A empresa, na verdade, criou um viveiro, com espécieis nativas e está promovendo o plantio dessa vegetação como uma das ações de responsabilidade socioambiental.

“Estamos trazendo de volta para Goiana parte do bioma que já não existia quando o pólo foi construido. Hoje são 295 espécieis diferentes que nascem no nosso viveiro. Mais que um projeto de paisagismo, quisemos trabalhar com espécieis nativas. Em 2014 e 2015 fizemos um trabalho de pesquisa técnica e histórica, com a UFPE e a UFRPE, da área para entender o que se tinha aqui. A partir disso tivemos um inventário dessas espécieis. Como a área que planejamos o replantio era grande e precisaríamos de muitas mudas, contruímos esse vivveiro. Hoje toda a nossa produção vai para os jardins, as vias, as rotatórias. Conseguimos abastecer toda nossa área, além das parcerias que a gente desenvolveu ao longo do tempo, com prefeituras, com outras empresas”, explica a analista ambiental da Stellantis, Danúbia Lima.

Danubia e Sayonara atuam nos projetos ambientais da Stellantis.

Danúbia explica que no terreno da fábrica há um pequeno remanescente de mata atlântica que está recebendo as mudas ao seu redor para formar um corredor ecológico. “Isso está facilitando o fluxo de espécieis que ainda existem. Já fotografamos a fauna voltando, como jaguatiricas, raposas, preguiças, tamanduás, entre outros animais. Conseguimos sentir o resultado porque estamos vendo a fauna voltando. Nosso objetivo é até 2024 chegar nos 304 hectares de área verde replantados”.

Além desse esforço para recomposição de parte da mata atlântica, a política ambiental da empresa contempla também o controle rigoroso dos resíduos. Danúbia explica que desde outubro de 2015 a Stellantis não envia nada para aterros sanitários. A prioridade é não gerar resíduos, mas o que é gerado segue para o reuso, reciclagem e, no último caso, para o co-processamento, que é o uso na geração de energia por uma outra empresa. “O caminho rumo à sustentabilidade requer várias estratégias. Temos várias práticas e projetos que somam os resultados que temos hoje. Trabalhamos muito no foco de subir na pirâmide dos 5 R’s, com a meta de reduzir cada vez mais a geração do resíduos. Todo o nosso material que não é possível de ser reciclado é enviado para o co-processamento, que é uma destinação com custo mais elevado, mas é ambientalmente mais correta. Está servindo de energia para um novo processo”.

Parte dos resíduos do Pólo Automotivo de Goiana são destinados também para confecção de produtos da Roda, um projeto de economia circular que usa como matéria prima couro, borrachas, cintos de segurança e até airbags para a criação de mochilas, bolsas, sandálias, entre muitos outros itens.

Acerca dos resíduos líquidos, o pólo possui uma Estação de Tratamento de Efluentes (ETE), que promove o reúso da maioria da água das fábricas. “Nossa ETE é a mais moderna do Grupo Stellantis, recuperando para o reciclo 99,5% da água. Praticamente a gente eliminou o uso de água potável para produção do veículo, que usamos praticamente apenas para consumo humano. Hoje nossa água de reúso tem, inclusive, uma qualidade superior de potabilidade do que a enviada pela concessionária”, exlica Sayonara Tavares, coordenadora de meio ambiente da Stellantis.

*Rafael Dantas é repórter da Revista Algomais (rafael@algomais.com)

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Essa matéria faz parte da série “Goiana: Uma década da chegada do polo automotivo” . O projeto teve apoio da Associação Brasileira de Jornalismo Investigativo (Abraji) e da Meta Journalism Project, em parceria com o International Center for Journalists (ICFJ).

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