“Diminuir limites de velocidade favorece a segurança de todos” – Revista Algomais – a revista de Pernambuco

“Diminuir limites de velocidade favorece a segurança de todos”

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Danielle Hoppe, Gerente de Mobilidade Ativa do ITDP Brasil, falou com a Algomais sobre as principais consequências do excesso de velocidade no trânsito e destacou algumas alternativas para combater essa infração que mata muita gente no País anualmente. As políticas de redução dos limites de velocidade, segundo estudos realizados pelos municípios e instituições de pesquisa, tem impacto insignificante no tempo de deslocamento, mas fundamental para redução dos sinistros.

Quais os principais resultados da velocidade praticada no trânsito no País? Precisamos avançar no debate da fiscalização e redução dos limites definidos hoje no País?

A velocidade inadequada é um dos principais fatores de risco nas lesões de trânsito, ela influencia tanto no risco de uma colisão acontecer, quanto na gravidade das lesões. Diminuir limites de velocidade favorece a segurança de todos os usuários da rua, inclusive a dos motoristas, há inúmeras evidências científicas.

No Brasil, anualmente, mais de 30 mil pessoas perdem a vida no trânsito, em áreas urbanas e rodovias. A nossa taxa de mortalidade está próxima de 15 mortes a cada 100.000 habitantes, que ainda é uma taxa muito alta. A título de comparação, nas Américas uma das menores taxas é a do Canadá, que em 2018 era próxima de 5 mortes por 100 mil habitantes.

As medidas implantadas ao longo dos últimos anos, como a lei seca e a fiscalização do excesso de velocidade, são cruciais, mas a gente ainda mata o equivalente à população de uma cidade inteira por ano. Em 2021 morreram 33.813 pessoas – um número aproximadamente 3,4% maior que o registrado em 2020, e maior que o número de óbitos de 2019, quando tivemos 32.667 mortes por sinistros de trânsito.

Isso mostra que essas medidas precisam ser ampliadas e que os limites de velocidade em áreas urbanas precisam ser revistos e reduzidos. A recomendação de velocidade máxima da OMS para vias urbanas é de 50 km/h.

Hoje quem são as principais vítimas do problema relacionado à velocidade no trânsito?

Atualmente, no Brasil, o grupo mais vulnerável é o grupo dos motociclistas, que representam 35% das mortes no trânsito, seguidos dos ocupantes de automóveis, com 21%. O pedestre representa 16%, o que equivale a 5.349 pessoas mortas em 2021. Esses dados incluem não só cidades, mas também rodovias (e por isso o alto número de ocupantes de automóveis).

Essa é uma tendência que vem se invertendo nos últimos anos, há algum tempo o maior número de mortes era de pedestres, mas com o aumento expressivo da frota de motocicletas no Brasil, o número de mortes de motociclistas vem crescendo rapidamente.
E temos ainda uma fatia de aproximadamente 19% de “outros ou não identificados”, que já dá também um indício de outro problema sério que temos, que é o registro dessas mortes e ferimentos, que muitas vezes têm pouca informação e dificultam o entendimento preciso do problema.

Temos alguma referência de cidade que conseguiu reduzir a velocidade nas suas vias de maneira efetiva e segura?

Um exemplo emblemático no Brasil é o caso de Fortaleza, que vem reduzindo aos poucos a velocidade limite em vias importantes, e conseguiu reduzir em 67% a média de acidentes com mortes nestas vias. É uma cidade brasileira que tem provado que, ao combinar capacidade técnica, vontade política e comunicação com a população é possível reduzir significativamente o número de mortes no trânsito e tornar a rua um espaço mais seguro para a população.

A experiência de São Paulo, em 2015, também trouxe resultados positivos – relatados aqui neste boletim da CET-SP.

Outro caso que anda muito na mídia é o de Paris, que recentemente limitou a 30 km/h a velocidade em grande parte da cidade, para reduzir mortes no trânsito e também a poluição. Mesmo nas vias que ficaram de fora da nova regulamentação, como a Champs Elysées, a velocidade limite é 50 km/h, que é a recomendação de velocidade máxima da OMS para vias urbanas.

Nos EUA, Nova York foi a primeira cidade nos Estados Unidos a adotar a abordagem da Visão Zero, em 2014. E eles conseguiram 28% de redução nas mortes no trânsito e 45% de redução no número de mortes de pedestres entre 2014 e 2017. Entre as principais medidas implementadas estiveram: Redução do limite de velocidade nas vias arteriais para 40 km/h (25mph) em toda cidade; Medidas de redesenho viário para redução de velocidade; Aumento da fiscalização de motoristas; Disponibilização online de estatísticas sobre segurança viária com linguagem de fácil compreensão para a população; Planos de segurança do pedestre elaborados para cada distrito; prioridade para intervenções em áreas de maior risco; e estratégia de comunicação e envolvimento da população.

A resistência por esse tipo de mudança (de redução da velocidade) em geral é bem grande por quem usa o transporte individual. A redução da velocidade tem qual impacto no tempo de deslocamento e nos engarrafamentos?

Acredito que os principais obstáculos sejam o desconhecimento quanto aos riscos associados à velocidade para todos os usuários da via, e uma falsa ideia de que a redução do limite de velocidade em áreas urbanas vai resultar em grandes aumentos do tempo de deslocamento, o que não tem sido comprovado nas iniciativas de redução de limites de velocidade pelo mundo.

A redução da velocidade limite tem um impacto insignificante no tempo de deslocamento. Um estudo realizado pela Prefeitura de Fortaleza mostrou um aumento de apenas 6 segundos no tempo médio de viagem a cada quilômetro percorrido. É um resultado ínfimo se pensarmos que, com a mesma medida, estamos evitando mortes e lesões graves que têm impactos psicológicos, sociais e econômicos bem maiores para a sociedade.

Quanto ao congestionamento, a diminuição da velocidade faz com que a distância entre os veículos também diminua, e pode, assim, resultar no aumento da capacidade de fluxo na via. Além disso, a redução das velocidades faz com existam menos sinistros de trânsito, os quais são uma causa frequente de congestionamento. São fenômenos pouco intuitivos, e talvez por isso tenhamos dificuldade em disseminá-los. Acho que sempre é importante lembrar, também, que nas cidades brasileiras, 42% dos deslocamentos diários são feitos a pé ou em bicicleta. Somente 26% dos deslocamentos são feitos em automóvel. Portanto, não temos tantos motoristas como achamos. Como entregamos ao carro entre 70 a 90% do espaço da rua, achamos que temos muitos motoristas, mas não é esta a nossa realidade.

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