Meninos também podem ser presidentes? (por Beatriz Braga)

*Por Beatriz Braga

A Islândia é considerado o melhor lugar do mundo para ser mulher. Não coincidentemente, foi o primeiro país do planeta a eleger uma presidente, Vigdís Finnbogadóttir. Depois de algum tempo do seu governo, um garoto se aproximou da dirigente e perguntou “meninos também podem ser presidentes quando crescerem?”.

Vigdís Finnbogadóttir

Ouvi a história na palestra da empresária islandesa Halla Tomasdottir. A plateia ri, claro. A inocência do garoto que ainda não conhece o mundo é tragicômica, mas traz a beleza do nosso ecossistema perfeito. Aprendemos pelo exemplo.

Lembrei do menino e da presidente ao ver a série Big Little Lies (HBO) – uma ótima dica para sua semana. Alerta spoiler! Em uma das várias histórias paralelas da trama, uma menina é agredida no colégio e as mães tentam descobrir quem é o pequeno ofensor.

As suspeitas recaem sobre Ziggy, criado por uma mãe solteira, vítima de estupro. A herança biológica, aparentemente, estaria latente em uma criança meio “esquisita”. Ninguém desconfia dos filhos do casal perfeito da cidade, mãe e pai loiros, altos, belos e educados. Mas é justamente o casal de comercial que esconde a faceta do marido agressivo. Eles acreditam que mantêm a relação abusiva em segredo, porém um dos filhos começa a dar sinais de que ouvia (e aprendia) com a relação dos pais. A herança do hábito, pois, fala mais alto.

O primeiro garoto, fruto do crime, é criado ao redor de compreensão, fala mansa e carinho. A mãe olha nos seus olhos e conversa com sinceridade. O filho da família “perfeita” cresce em volta dos gritos e dos ciúmes. Enxerga na coleguinha o que o pai vê na mãe: uma propriedade.

Herança é coisa séria. Não necessariamente a que engordará nossas economias, mas aquela que fará de nós os humanos que somos.
Na mais nova polêmica brasileira, eu volto a pensar no exemplo que damos às crianças. Um artista fazia uma performance envolvendo nudez no Museu de Arte Moderna de São Paulo e uma garota, acompanhada da mãe, pegou no seu pé. Chamaram o artista de pedófilo, acusaram-no de erotizar a infância.

O problema do mundo não está na nudez. E muito menos na criança que interage com ela. Está na forma como a sociedade trata a natureza e nos traumas que passamos para nossos filhos. Erotizamos os nossos corpos e censuramos atitudes naturais desde pequenos.
Nem todo nu é erótico. Tem o que é arte, aprendizado e beleza. Enquanto nos ocupamos de reprimir performances artísticas, o machismo real, bem vestido, destrói infâncias e dá péssimos exemplos à próxima geração.

A polêmica do MAM é o eco do “fecha perna, menina” que passamos a vida escutando. Censuramos a arte, calamos nossos filhos e toleramos músicas que falam das “novinhas” na balada. Sejamos vigilantes, sempre, mas vamos escolher melhor nossas batalhas.

beatriz outubro 3

Halla Tomasdottir tinha sete anos quando viu a primeira greve de mulheres na Islândia. Doze quando Vidgis assumiu o poder. Aos 47, inspirada pelo seus modelos da infância, candidatou-se à presidência. Não ganhou as eleições, ficou em segundo lugar, mas destaca como uma vitória o impacto de sua empreitada na filha adolescente. A autoconfiança, diz ela, foi transmitida pelas gerações.

Halla Tómasdottir

De alguma maneira, a filha de Halla, o pequeno agressor, Ziggy e a menina do MAM são histórias paralelas de erros e sucessos com nossas crianças. Que tal abraçarmos a missão de, todos os dias, prestarmos atenção ao que dizemos e fazemos perto delas? Menos censura, mais arte, mais amor e mais bons exemplos, para começar.

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