“O PT busca reconstruir, nacionalmente, a aliança com o PSB”

Túlio Velho Barreto, cientista político e pesquisador da Fundação Joaquim Nabuco, em entrevista com o jornalista Rafael Dantas, analisa o complexo cenário das eleições 2022 em Pernambuco. Mesmo com a longevidade do PSB, ele aposta que o partido segue como o mais forte concorrente nas eleições do próximo ano no Estado. O analista político avalia também que a rejeição ao presidente Jair Bolsonaro deve atrapalhar os partidos de direita em Pernambuco e que o tema da pandemia tende a ocupar um lugar de destaque no debate eleitoral.

Quais as principais forças das eleições de 2022 em Pernambuco?
Olhando para o cenário atual, penso que o PSB desponta como a principal força eleitoral para a disputa eleitoral de 2022 em Pernambuco. Isso decorre do fato de o partido estar à frente da prefeitura do Recife e do governo do Estado há bastante tempo. No governo estadual, no final desse ciclo Eduardo Campos-Paulo Câmara, serão 16 anos no poder. Apesar do desgaste comum a governos longevos, o que chamamos, numa analogia com a engenharia mecânica, de “fadiga dos materiais”, o PSB não parece ter um concorrente forte no mesmo campo político, que, no caso, seria o PT. Digo isso, porque o PT tem um projeto nacional de alianças, que tende a incluir o PSB e, no plano estadual, não tem se desgarrado da liderança socialista. Nem tem um concorrente forte à direita, nesse caso, porque já faz tempo que a direita pernambucana não consegue construir uma ou mais candidaturas competitivas. E a direita local aindatem e terá em 2022 a sombra ou mesmo a presença do Jair Bolsonaro e o seu perfil extremista a atrapalhar as candidaturas, vamos dizer, mais ligth de centro-direita ou mesmo de direita. Portanto, o chamado “poder da caneta” de distribuir recursos e cargos, que está nas mãos do PSB, pode ser fator importante a desequilibrar a disputa favoravelmente à legenda governista. Mas, ressalto, esse é o cenário a um ano das eleições, o que, em política, pode significar muito mais, sobretudo em tempos tão tumultuados como os que vivemos.

Qual deve ser o futuro político do governador Paulo Câmara? Quais as principais tendências que estão sendo discutidas nos bastidores?
Como ator político, Paulo Câmara tem um perfil não tão fácil de analisar. Por um lado, porque era um técnico que foi catapultado ao governo do Estado por um político carismático, que gozava de grande visibilidade e popularidade, como Eduardo Campos. Sabe-se que a escolha de seu nome para suceder Campos não foi fácil e aparentemente resultou de sua relação pessoal próxima com o então governador, e até mesmo por exclusão. Pelo menos é a impressão que ficou na ocasião. Por outro lado, essa é minha interpretação, Câmara nunca conseguiu adquirir brilho próprio. Às vezes deu até a entender que não se sentia ou não se sente muito à vontade na vida pública. Mas, apesar disso tudo, foi reeleito e, em seus mandatos, conseguiu reeleger Geraldo Júlio e eleger o jovem e inexperiente João Campos no Recife. Se pensarmos que há, na política, um percurso “natural”, o seu próximo passo seria candidatar-se ao Senado. Ou mesmo dar um salto maior e, no bojo de uma aliança nacional com o PT, ou outro partido nesse campo, ser, por exemplo, candidato a vice-presidente. Isso porque o PSB tem em Pernambuco a sua maior base eleitoral e visibilidade política. Mas, no plano nacional, isso dependerá de muitos acordos e do contexto político até lá. Já no plano local uma eventual candidatura ao Senado será vista como “natural”. E talvez este seja o caminho mais provável a seguir.

O cenário nacional terá impacto nas urnas da decisão do Governo e senado em Pernambuco e na formação das chapas? Como a relação PT e PSB no cenário nacional influenciará a relação local?
De certa forma, já comecei a responder essa questão com a análise feita na resposta anterior. Mas, sim, a eleição nacional sempre tem impacto nos arranjos eleitorais locais e isso ocorrerá também em 2022. Isso é e será inevitável. Ainda mais porque o PT busca reconstruir, nacionalmente, a aliança com o PSB, desgastada pelo apoio dado por essa legenda ao golpe jurídico-parlamentar contra a então presidenta Dilma Rousseff, em 2016, e também pelo afastamento que se deu já nas eleições presidenciais de 2014. Mas dependerá da opção nacional do PSB, se se aliará ao PT, numa frente ampla, ou se procurará ter mais protagonismo e se aliará ao PDT, por exemplo, ou outras legendas buscando atuar em um campo próprio. Isso não está claro ainda. No caso de uma eventual aliança com o PT, no caso, movido pela necessidade de ampliar ao máximo uma frente antifascista competitiva, o arranjo na chapa majoritária provavelmente capitaneada pelo PSB no Estado sofrerá ainda mais influências do arranjo nacional.

A Pandemia deve ocupar um papel forte no debate político em 2022? Que temas devem se sobressair?
Sim, com certeza. O mundo vive há quase dois anos uma crise sanitária sem precedentes nos últimos 100 anos. E no Brasil essa crise tem sido atravessada por um governo federal que tem agido politicamente de forma irresponsável e inconsequente, o tem contribuído, certamente, para exponenciar ainda mais os casos de contaminação e de óbitos. E, provavelmente, ao final dessa pandemia, não restará alguém que não tenha perdido, pelo menos, um parente ou amigo ou conhecido para o covid-19. E mais: a atual crise sanitária escancarou a necessidade de as esferas públicas, em todos os níveis, mas sobretudo no plano federal, agir na área da saúde. O SUS é exemplo disso. Tem ficado claro o quanto é premente dotar os poderes públicos de políticas de saúde que atendam às necessidades e demandas dos setores mais necessitados e vulneráveis da população. Portanto, a saúde, que sempre esteve entre os cincos temas mais importantes durante as campanhas eleitorais, deve ganhar ainda mais protagonismo. Até porque, em larga medida, o governo federal tentou se contrapor e expor suas divergências quanto à gestão da crise pelos governos estaduais. Será hora de apontar à população quem estava, está com a razão. Além da saúde, outros temas vão pautar os programas partidários e os debates, como o da segurança pública, que deve trazer à discussão acerca da maior liberação de armas de fogo ou não; da educação; do combate ao desemprego; da retomada das atividades econômicas, com financiamento e incentivos fiscais; do déficit habitacional. No plano mais geral, dois temas devem pautar ainda os candidatos e candidatas majoritárias: um, que deverá permanecer, será o da corrupção; e outro, que deverá aparecer, será o da defesa da democracia.

As novas regras eleitorais mudam alguma coisa no cenário local?
Toda mudança nessas regras impacta nas campanhas e resultados das disputas eleitorais. E as mudanças, muitas substantivas, têm ocorrido no Brasil com alguma frequência. É até difícil para a maioria do eleitorado acompanhar o que está valendo. E mesmo para os atores políticos se adaptarem a tais mudanças. Isso não é bom para a democracia e para o jogo político, porque, geralmente, as mudanças atendem aos interesses mais pragmáticos dos atores políticos, aos seus interesses mais imediatos. E não ao aperfeiçoamento dos arranjos institucionais e republicanos, da democracia, enfim. No caso das próximas eleições, no final de setembro, o Congresso Nacional aprovou a Emenda Constitucional Nº 11/21, que não provocará, no meu entendimento, muitos impactos nas eleições de 2022, em especial porque o Senado rejeitou a proposta aprovada na Câmara que previa o retorno das coligações partidárias nas disputas proporcionais. As mudanças flexibilizaram a legislação que trata da fidelidade partidária, para que o eleito ou a eleita possa mudar de legenda se houver anuência do partido, e estabeleceu que os votos dados às candidaturas de mulheres, indígenas e afrodescentes sejam contados em dobro para efeito de distribuição dos fundos partidários. Mas, frise-se, não garante cotas para tais candidaturas. Então, no meu entendimento, o impacto dessas mudanças não trará tanto efeito sobre as eleições desta vez.

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