Patrícia na luta pela obra de Naná Vasconcelos

“Eu sou um Brasil que o Brasil não conhece”. Patrícia, viúva de Naná Vasconcelos, lembra que o músico se apresentava com essas palavras, traduzidas em diferentes línguas, para as multidões que o acompanharam pelo mundo. Naná faleceu aos 71 anos em março, sete meses após ser diagnosticado com câncer de pulmão, e transpirou a música dos seus ancestrais até o último segundo. No período em que lutava contra a doença, o percussionista pernambucano trabalhou no álbum que fecharia sua viagem sonora através do sagrado: O Budista Afrobudista.

No projeto inspirado em cânticos e mantras sacros, Naná transforma a dor em música. “O processo de produção de todo o disco foi marcado pela grandeza de Naná em superar o momento difícil que enfrentava”, revela Patrícia Vasconcelos. Ela, que nos últimos oito anos trabalhou ao lado do marido como produtora, lamenta a falta de conhecimento da maioria dos brasileiros diante da imensa obra do músico. “O trabalho de Naná é muito mais valorizado em outros países do que no Brasil. Aqui, as pessoas ainda não despertaram para a sua genialidade”, desabafa.

O percussionista gravou a maioria das músicas de O Budista Afrobudista em um reprodutor de som portátil e outra parte compôs já internado, ao lado do compositor e multi-instrumentista Egberto Gismonti e do maestro Gil Jardim, antigos parceiros musicais. “O trabalho está praticamente completo. Falta gravarmos apenas três faixas. O mais importante, agora, é captar recursos”, explica Patrícia, que está produzindo o álbum. Seu desejo é lançá-lo ainda este ano, em dezembro.

O nome da obra é inspirado no título de uma reportagem publicada pelo jornal argentino La Nación no ano passado: “El budista afro de la percusión” (O budista afro da percussão, em tradução livre). “Quando leu a matéria, Naná me disse: ‘Que bonito! Meu próximo disco terá essas palavras’”, lembra Patrícia. A música homônima está sendo finalizada por Egberto Gismontti que recebeu, no hospital, instruções precisas do percussionista através de gestos e até batuques no lençol da cama ou em embalagens de comida. Gil Jardim ficou encarregado de produzir outra importante canção-mantra do álbum, Amém e amem, dizeres grafados na lápide de Naná.

A música Respire Fundo e Diga 33, trilha do espetáculo de balé do projeto Dança Vida, de São Paulo, também surgiu como uma espécie de cura. “Todo dia, um médico da equipe que tratava Naná o examinava e pedia que respirasse fundo e dissesse ’33’. Já exausto de todo o tratamento, ele acabou se irritando”, relembra Patrícia. “Após algumas conversas”, conta, “Naná se refez e disse que faria uma música em homenagem à orientação. Para mim, é uma lição de superação. Durante todo o tempo, ele esteve consciente e se curando por meio da sonoridade do que sentia. Eu vejo esse trabalho como uma mensagem de paz”.

Outros planos

Dentre as prioridades de Patrícia na missão de preservar a história de Naná Vasconcelos, está a parceria com os diretores pernambucanos André Brasileiro e Tuca Siqueira, na produção do documentário Caminhos. Previsto para ser lançado no final de 2017, o filme apresentará imagens atuais e de acervo pessoal, narrando momentos notáveis da vida do músico.

Para além dos primeiros projetos, a ideia de Patrícia é reunir toda a obra de Naná e abrir um museu. A proposta também é criar exposições itinerantes e uma retrospectiva dos 16 anos em que o músico comandou a abertura do Carnaval do Recife, focando no trabalho social desenvolvido por ele durante as festas de Momo. “Desejo inaugurar um espaço físico para que as pessoas possam ter acesso à obra dele. Quero que o local seja um referencial para o mundo”, revela.

Por Maria Regina Jardim

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