“Pessoas influentes devem propagar informações sobre a prevenção da Covid-19”

Por que, em plena pandemia, as pessoas não usam máscaras e descumprem o isolamento social? A resposta parece não ser simples. De acordo com a psicóloga Suzana Konstantinos Livadias, existem questões de cunho econômico e social, que levam indivíduos a questionarem por que podem se aglomerar no transporte público para trabalhar e não podem se unir a uma multidão para se divertir. Suzana, que coordena o Espaço Trans – voltado à população transexual e travesti no Hospital das Clínicas/UFPE – também critica o comportamento do presidente Jair Bolsonaro e de celebridades que não adotam as medidas preventivas e influenciam um grande número de pessoas. Nesta entrevista a Cláudia Santos, a psicóloga analisa essas questões e faz um apelo para que a mídia e as pessoas influentes sejam responsáveis e estimulem a sociedade a se proteger contra o coronavírus.

Você considera que muitas pessoas acreditam que não serão contaminadas e por isso não seguem as medidas de prevenção à Covid-19?

Acho que tem esse fator. Não posso dizer que essa é a questão que motiva as pessoas a não seguirem as medidas, mas acho que, na medida em que não temos a concretude do vírus, porque ele é algo invisível, talvez as pessoas, de fato, tenham a dificuldade de entender a necessidade de prevenção e até por terem um repertório reduzido de informações e de compreensão da ciência. Mas acho que tem outra questão sobre pessoas representativas que, simbolicamente, têm uma importância. Elas poderiam ser esse intermediador de propagação de informações sobre a prevenção da Covid-19, na medida em que muita gente acreditaria naquilo que alguém importante está dizendo.

Quando vemos, por exemplo, o presidente Jair Bolsonaro não usando a máscara, contrário ao isolamento social e ao lockdown, é compreensível o sujeito comum também dizer: “se o presidente, que é o presidente, não está usando, por que eu vou usar?” Ele ocupa um lugar simbólico de representatividade, é o cargo de poder máximo do nosso País. Ele exerce uma influência muito grande na medida em que os comportamentos dele serão divulgados, têm visibilidade, então isso impacta sim, e de uma forma negativa. Há um texto teórico chamado Pacto edípico e pacto social (do psicanalista e escritor Hélio Pelegrino?), é uma análise psicanalítica que vai trazer essa questão de que se essas regras de prevenção não são cumpridas na macroestrutura, por alguém que é responsável por cuidar das pessoas, na sua microesfera, as pessoas também não vão cumprir suas regras. Se os pactos sociais não são cumpridos, os pactos mais individualizados também não serão. Há uma autorização implícita, tácita, que as pessoas acabam também reproduzindo.

Existe um desconhecimento das pessoas de que, ao não adotar as medidas de prevenção da Covid, pode impactar na saúde das outras pessoas, inclusive de familiares?

Pessoas que têm um repertório mais restrito de informações podem ter dificuldades de entender que sua atitude pode prejudicar os demais. Mas acho que há também um pouco de ausência do senso de coletividade, de uma falta, talvez, de compreensão de que a minha atitude vai refletir num cuidado mais coletivo, de cuidar do outro. As pessoas estão mais voltadas para si, num certo egoísmo, num certo hedonismo, até porque, se a gestão pública, que cuida de todo mundo, informa que você tem que trabalhar, porque senão vai ficar com fome, isso sugere que você é o responsável pela sua sobrevivência. Então, se não há um cuidado de uma gestão pública para se responsabilizar por esse aspecto coletivo, o sujeito, por si, só também acha que não deve se cuidar. Mais uma vez eu volto à questão do pacto social. A população assiste a pessoas significativas, como Gabigol e Elba Ramalho (ambos foram flagrados pela polícia ao organizarem festas para muitas pessoas) fazendo grandes comemorações e podendo curtir, e passa a pensar: “se eles podem, por que que a gente não pode, né?”

O fato de as pessoas terem que se expor para trabalhar e pegar transporte público lotado, as levam a pensar que também têm direito de se expor para se divertir?

Eu acho que isso é uma relação muito direta. Divertir-se também está sendo colocado um pouco como álibi para sair, porque traria benefícios para a saúde mental. De fato, a saúde mental fica prejudicada se a gente não tem laços no convívio social. Mas é preciso ponderar. Diante das circunstâncias, o que a gente prioriza: a vida, o cuidado, o altruísmo no sentido de cuidar do outro ou aglomerar? Mas, essa relação de poder aglomerar para trabalhar e não poder para se divertir pode não ter sentido para muita gente. Outra questão é que em muitas comunidades vulneráveis, falar em isolamento social é até risível. Muitas pessoas trazem para nós o seguinte pensamento: “como fazer isolamento social se na minha casa moram 13 pessoas e só existem dois cômodos?”. Precisávamos dar alternativas para aqueles que não têm condições de fazer o isolamento social. Então, só os privilegiados, só aqueles que residem num espaço maior vão poder fazer?

Leia a entrevista completa na edição 181.1 da Revista Algomais: assine.algomais.com

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