Sandro Prado: “Estados do Nordeste sofrerão muito com a PEC dos Combustíveis”

Ir ao supermercado, pagar a conta de luz ou abastecer o carro são ações cotidianas que se tornaram cada vez mais penosas para o bolso da classe média, que ainda faz verdadeiros malabarismos para pagar o colégio dos filhos e o plano de saúde. Para as populações pobres, a situação é ainda mais complicada com o desemprego e o alto preço de produtos básicos como gás de cozinha e alimentação. Para entender por que a inflação persiste em índices altos, Cláudia Santos conversou com o economista, conselheiro do Corecon (Conselho Regional de Economia de Pernambuco) Sandro Prado. Um dos pontos destacados pelo especialista é o descontrole dos preços monitorados pelo Governo Federal. Prado, porém, não acredita que a solução esteja na PEC (Proposta de Emenda à Constituição) proposta pelo presidente Bolsonaro para conter a alta dos combustíveis.

Quais os fatores que impulsionam o aumento da inflação?

Um dos itens que tem contribuído muito são os preços monitorados pelo Governo Federal, como o dos combustíveis. O óleo diesel subiu cerca de 47% só no ano de 2022. Esse aumento passa para o frete, o que acaba impactando em vários produtos, já que são transportados pelo modal rodoviário. Isso tem um efeito multiplicador por toda a economia. Também faz uma pressão nos transportes, aumentando o preço de passagens aéreas, passagens de ônibus, de aplicativos, como o Uber, dos deliveries. Ocorre então um aumento nos custos, vivenciamos uma inflação de custos e um dos responsáveis é a política de preços da Petrobras.

Outra questão, que aqui em Pernambuco é forte, foi o aumento da energia elétrica, muito além da inflação, de cerca de 19%, o que também aumenta os custos. O mesmo ocorreu com os preços dos planos de saúde, monitorados pelo governo, que também foram reajustados acima da taxa da inflação. E os alimentos tiveram uma alta muito grande, puxada por algumas commodities, como a carne bovina, de frango, suína, ou seja, proteína animal subiu bem acima da inflação, assim como o arroz, o trigo, o feijão, o óleo de soja. Cada um por motivos diferentes. Não somos, por exemplo, autossuficientes na produção de trigo, que importamos da Argentina, cuja safra não foi boa. A guerra na Ucrânia também influencia, já que o país é um grande produtor.

Todos são produtos da cesta básica, ou seja, do prato do brasileiro, o que é um grande problema, seja se você come em casa, compra uma quentinha para almoçar ou faz alimentação em restaurantes. Esse aumento ocorreu por causa do custo da produção como o frete, a energia e os fertilizantes. É um absurdo, mas o Brasil não é autossuficiente na produção de fertilizantes e eles subiram de preço também porque a maioria dos minérios aumentaram por causa da guerra na Ucrânia.

Tivemos aumentos também nos gastos domésticos em geral, de moradia, despesas com educação. Na verdade, tudo subiu. A inflação do ano de 2021 foi 10,06%, mas a acumulada hoje é 11,73%. Caminhamos para o segundo ano consecutivo com uma inflação acima dos 10%. Isso nunca aconteceu desde o Plano Real O mercado, que é superconservador, prevê quase 9%, o último Boletim Focus apontou 8,89%, mas falamos, desde o começo do ano, que a inflação seria superior a 10%.

Qual o impacto da PEC anunciada pelo Governo Bolsonaro para reduzir os preços dos combustíveis?

A PEC dos Combustíveis é uma das ideias mais estapafúrdias e eleitoreiras que vi nos últimos tempos. O Governo Federal zeraria as alíquotas do PIS e o Cofins sobre os combustíveis, que são tributos federais que correspondem a R$ 0,60 no litro de gasolina. Para que o governo tire essa tributação, os governadores dos Estados terão um limite de cobrança de ICMS dos combustíveis, mas também de energia, telecomunicações e transportes, de 17%. Mas acontece que hoje a base da arrecadação de muitos Estados advém da tributação sobre energia elétrica e sobre o combustível. Existem Estados cuja arrecadação chega a ser cerca de 25% a 30% proveniente dessas cobranças. Então, não se pode reduzir essa tributação de uma forma abrupta, sem que seja feita de uma maneira gradativa, porque muitos Estados terão uma redução significativa no orçamento, o que significa menos investimentos em educação, em saúde, em transporte público e outros serviços básicos. Os Estados do Nordeste e do Norte sofrerão muito com essa medida caso ela seja aprovada.

Ainda há uma outra ideia de que os governadores poderiam zerar a alíquota de ICMS e essa diferença do zero a 17% a União repassaria para os estados. Ou seja, a PEC deixaria os estados na mão do Governo Federal, daria um rombo enorme nas contas públicas, além de ser uma medida paliativa já que vigora até o fim deste ano. Portanto só tem motivação eleitoreira.

É uma política que contraria a lógica tributária, a lógica do orçamento dos estados. Pior: caso alguém se oponha a essa ideia vai ser taxado como inimigo do povo e aí obviamente também deputados estaduais e senadores, ou seja candidatos, se valerão disso nas eleições de 2022.

O aumento dos juros pode conter a inflação?

Estamos numa inflação de custo. O aumento da taxa de juros funciona bem para inflação de demanda, ou seja, a taxa Selic inibe o consumo os brasileiros. Para você ter uma ideia, 77% das famílias brasileiras se autodeclaram endividadas, em Pernambuco esse número chega a 83%. É normal para o brasileiro se endividar, é raro alguém comprar um televisor, uma geladeira, um carro à vista. É um comportamento cultural: a gente não ganha para comprar, a gente gasta antes de ganhar.

O número de inadimplentes também é alto: quase 25%. Quando a taxa de juros aumenta, inibe o consumo, porque aumenta os juros do cartão de crédito, cheque especial, do crediário. Só que essa cartilha ortodoxa de economia monetária liberal não funciona muito bem no momento porque, na verdade, o principal vilão da inflação é próprio Governo Federal que tem deixado aumentar os preços das coisas básicas, como os combustíveis, o que provoca um aumento generalizado.

Leia a entrevista completa na edição 195.2 da Algomais: assine.algomais.com

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